CRÓNICA DE DANIEL OLIVEIRA - O INDEFENSÁVEL

 

 

 

 

O indefensável

 

O futebol põe as pessoas a dizer coisas extraordinárias. Os mais inteligentes tornam-se básicos, os mais lúcidos mentecaptos, os mais equilibrados talibãs, os mais frontais cordeiros, os mais coerentes demagogos profissionais.

  

E um excelente exemplo foi buscá-lo recentemente Ricardo Araújo Pereira: Miguel Sousa Tavares e Rui Moreira ficaram danados com as escutas a José Sócrates no caso Face Oculta.

 

Com razão. As escutas só podem ser públicas quando têm como função a persecução da justiça. E a justiça não se faz nos jornais ou no You Tube.

 

Mas sobre as escutas a Sócrates, acrescentou nessa altura Miguel Sousa Tavares: “ Uma vez que as conhecemos, não podemos fingir que não conhecemos.” Rui Moreira explicou este raciocínio, que subscrevo: “Ninguém se pode alhear do que é público e das consequências. Diferente é o ato de divulgar e promover escutas ou tentar reabrir, na praça pública, processos já julgados em tribunal.”

 

Mas isso deve aplicar-se aos dois casos. Devemos condenar a divulgação das escutas a Sócrates e a Pinto da Costa. Não podemos ignorar nenhuma delas. Só que quer Moreira quer Sousa Tavares condenam as duas mas decidem ignorar o conteúdo de apenas uma delas.

 

O que eu não posso ignorar, mesmo que quisesse, é que há um dirigente de futebol que não tem meias-medidas nas suas relações promíscuas com a arbitragem. Queria não saber. Mas sei. Ouvi. E imagino que Rui Moreira e Sousa Tavares ouviram. O problema do futebol é que, ao contrário do que acontece com a política, nunca mudamos de lado. E não mudando, ficamos sem palavras quando o nosso clube se porta mal.

 

O problema de Rui Moreira e Miguel Sousa Tavares é que não ficaram sem palavras. Prestam-se a defender o indefensável.

 

Daniel Oliveira, Record, 22 de Outubro de 2010

GRANDE REMATE DE magalhaes-sad-slb às 16:36 | COMENTAR | VER COMENTÁRIOS (4) | favorito